Em defesa da Dignidade Humana e de um mundo melhor
Caros Concidadãos,
Povo Português,
Subitamente, um tempo que muitos antecipavam como sendo o princípio do «fim da História», acreditando, como Francis Fukuyama, na universalização dos valores da democracia liberal e da paz, de novo se revelou uma «era de incerteza», de risco e elevada perigosidade, epíteto com que John Kenneth Galbraith batizou o século XX. Subitamente, ou talvez não, porque só os mais desatentos não percebiam, nessa já distante mudança de milénio, tomámos plena consciência de que os grandes problemas da Humanidade continuavam por resolver, e que a guerra, a fome, a pobreza e as desigualdades sociais insistiam em perdurar na maior parte do Mundo.
Os dramas, ou melhor, tragédias do nosso tempo têm vindo a agravar-se. As guerras na Ucrânia e no Médio Oriente, a ameaça nuclear e o aumento das desigualdades forçam-nos a olhar para o mundo em que vivemos com crescente preocupação, uma vez que estes retrocessos civilizacionais ocorrem também noutros pontos do planeta, espalhando a fome, a morte, a pobreza, as doenças, os fanatismos, o desrespeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos. Apesar de ter sido poupado, há mais de um século, aos horrores da guerra, Portugal não lhes será imune caso venha a suceder uma escalada que a generalize. Mas, em contraponto, já não tem escapado ao agravamento das diferenças sociais existentes entre os seus cidadãos, o que nos penaliza e responsabiliza, a todos, como sociedade.
Aproximando-se o fim do ano em que comemoramos o 50º aniversário do 25 de Abril, data memorável que abriu um tempo novo de oportunidades para todos os portugueses, precisamos de reforçar o nosso nível de exigência sobre a nossa vida coletiva e as políticas públicas que a determinam, fomentando as condições para que Abril continue a realizar-se, sem recuos nem hesitações.
O Grande Oriente Lusitano – Maçonaria Portuguesa esteve sempre envolvido, nos seus 222 anos de história, na defesa das grandes causas e na promoção dos princípios e valores da Democracia, da Liberdade, da Igualdade, da Fraternidade e da Tolerância. Desde o 25 de Abril de 1974 que nos temos empenhado em colaborar com as instituições públicas nacionais que têm promovido o desenvolvimento e o bem-estar social do país e dos portugueses. Hoje, estamos conscientes de que essa progressão tem vindo a estagnar nos últimos anos e que o elevador social se encontra praticamente parado. Ora, uma sociedade progressiva e fraterna não pode ficar imóvel por muito tempo, precisando de continuar a desenvolver-se e a criar oportunidades para todos, sob pena de gerar anticorpos que a poderão destruir. É, por conseguinte, necessário perceber porque não estamos a atingir plenamente os nossos objetivos e encontrar soluções que contrariem essa estagnação.
A Maçonaria e o Grande Oriente Lusitano estiveram sempre na vanguarda do progresso e do desenvolvimento social. Esse continua a ser o nosso compromisso para com o País e os Portugueses. Como Ordem Iniciática e progressiva nascida nas Luzes, sabemos que uma sociedade será tanto mais desenvolvida quanto mais elevado for o seu nível de alfabetização, graduação e formação superior, cultural e universitária. Deste modo, não descurando as muitas áreas em que temos de investir e crescer, a Educação é talvez a mais importante. É que a Educação é, simultaneamente, a primeira causa para o desenvolvimento de qualquer sociedade que se queira justa e igualitária, é o motor para a ascensão e nivelação social e para o combate e a erradicação da pobreza. Ela é, por isso, um direito fundamental universal, que se encontra consagrado em todas as Constituições políticas dos Estados de direito democráticos, que já estava previsto na nossa primeira Constituição liberal de 1822 (artigo 237º), assim como no artigo 26º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Neste último pode ler-se que: «A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos».
Não foi, pois, por mera casualidade que o Grande Oriente Lusitano e os maçons portugueses foram sempre promotores da Educação e do combate ao analfabetismo e à ignorância. Estas são as causas de todas as intolerâncias, dos extremismos e dos populismos. Da xenofobia e dos fascismos. A Maçonaria e os maçons não poderiam ignorá-lo.
Foi com estes nobres propósitos que Manuel da Silva Passos, maçon português, operou profundas reformas no Ensino Básico, Secundário e Superior, no pouco tempo em que esteve no governo. Foi o seu governo que criou os liceus portugueses, a Escola Politécnica de Lisboa e a Academia Politécnica do Porto (1837), os Conservatórios de Artes e Ofícios (Lisboa, em 1836, e Porto, em 1837), o Conservatório Geral da Arte Dramática, em 1836, e a Academia de Belas-Artes, em 1836. Também a Maçonaria Portuguesa esteve envolvida nas importantes reformas educativas dos vários governos da Iª República e no combate que conduziram contra o analfabetismo. Escolas populares foram abertas, bem como as desde há muito desejadas Universidades de Lisboa e do Porto. Em termos de inovação pedagógica merece realce a Escola Oficina n.º 1, criada por maçons e que ainda hoje integra o património imaterial do Grande Oriente Lusitano. Por último, as conquistas obtidas após o 25 de Abril, com a universalização da Escola Pública e a criação de um ensino superior de custo reduzido.
Contudo, os dias de hoje trazem a todos novos desafios. Desde logo, a necessidade de incorporar numa Escola que seja inclusiva as minorias que, por diferentes motivos, acorreram nos anos recentes ao nosso País. Não podemos permitir que a Escola marginalize, em vez de integrar, como desejam os populismos, e essa é hoje uma preocupação essencial que tem também de ser acompanhada pela atualização dos currículos escolares, com vista à concretização desse objetivo. Também se torna necessário dotar as Escolas dos meios tecnológicos necessários à modernização do ensino, que precisam de ser de acesso generalizado no País e não apenas nalgumas localidades. Por outro lado, há que não descurar a contribuição que pode ser dada pela Inteligência Artificial, com as necessárias precauções que essa transformação tecnológica tão radical pressupõe, cuidados que têm de ser estendidos ao impacto das redes sociais na formação dos nossos jovens. Deve ser dada uma importantíssima atenção aos recursos humanos das instituições de ensino básico, secundário e superior, garantindo boas condições de trabalho e remuneratórias para os professores e assistentes operacionais, sem os quais a Escola não existe.
A maçonaria considera fundamentais os investimentos no combate às desigualdades no acesso à educação de qualidade entre os jovens de regiões urbanas e rurais, bem como às oportunidades desiguais de crianças de contextos desfavorecidos o que perpetua ciclos de pobreza.
Para que a educação se traduza em progresso e desenvolvimento urge também promover uma maior ligação do ensino e da formação com o mercado de trabalho e com as reais necessidades do país.
Para todos estes novos desafios o Grande Oriente Lusitano – Maçonaria Portuguesa procurará dar a sua contribuição, refletindo nos seus diversos fóruns e em parceria com a sociedade civil, produzindo e publicando pensamento, sugerindo políticas públicas, reafirmando o seu compromisso e passado histórico de promover os valores da Liberdade, Igualdade, Fraternidade pelo desenvolvimento da Educação. Educação que potencia uma participação cívica e de cidadania mais eficaz em prol da defesa da dignidade humana.
Lisboa, 11 de dezembro de 2024
Fernando Cabecinha
Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano – Maçonaria Portuguesa
Palácio Maçónico